sábado, 20 de junho de 2015

Alguém poderia substituir Agatha Christie?


Fã da Rainha do Crime, a britânica teve “a sorte e a honra” de escrever um novo romance, conduzido por outro insubstituível: HerculePoirot. Maria Ramos Silva não correu risco de vida com “Os Crimes do Monograma”


“Sentado no seu café preferido, prepara-se para mais um jantar de quinta-feira. Tudo calmo até ser surpreendido por Jennie, que garante estar prestes a ser assassinada e, mais insólito ainda, que lhe suplica que não investigue o caso”
(trecho do livro)


É fácil adivinhar que esta mulher tem à sua frente o ilustre Hercule Poirot. Mais complicado é imaginar o resto da história e, acima de tudo, como escrevê-la sem defraudar a mãe de um dos personagens mais famosos da ficção policial. Coube a Sophie Hannah reativar as células cinzentas do "belga brilhante" em "Os Crimes do Monograma", o primeiro livro que dá seguimento à obra de Agatha Christie depois da sua morte, em 1976. Um desafio de peso, como nos relata a escritora através desta descontraída entrevista.


LEMBRA-SE DE QUANDO COMEÇOU A LER OS LIVROS DE AGATHA CHRISTIE?
Lembro-me perfeitamente. Quando era pequena o meu pai costumava arrastar-me para feiras de alfarrabistas. Era um colecionador obsessivo de livros sobre críquete. Tinha uns 12 anos e certo dia, para me manter quieta, comprou-me uma velha edição de um livro de Agatha Christie, "Um Corpo na Biblioteca". Adorei, e depois disso passei a acompanhar o meu pai a todas essas feiras, em busca de outras obras. Quando cheguei aos 14 anos já tinha comprado e lido a coleção completa.

COMO DECORREU O PROCESSO DE ELEIÇÃO DE UM AUTOR PARA SUCEDER A AGATHA CHRISTIE, NESTA DIFÍCIL MISSÃO DE CONTINUAR A DAR VIDA A HERCULE POIROT?
Tive uma grande sorte. Aconteceu que o meu agente tinha encontrado com o editor de Agatha Christie a propósito de outro assunto qualquer. De repente lembrou-se de lhe dizer: "Sabe que mais? Devia pedir à minha autora, a Sophie Hannah, que escrevesse um novo romance com Poirot, ela é uma grande fã de AgathaChristie." No dia seguinte o editor comunicou com os detentores dos direitos da escritora e mencionou esta hipótese.

ESPERAVA TER SUCESSO?
Pensava que a resposta seria "não", já que apenas no passado se levantara esta questão de alguém escrever um novo romance de Agatha Christie. Sucede que a família de Christie estava a pensar precisamente nessa eventualidade, de dar seguimento à sua obra. Foi uma feliz coincidência. Tudo aconteceu na hora certa, para grande sorte minha.

PELA RESPONSABILIDADE QUE REPRESENTAVA A MISSÃO DE SUBSTITUIR AGATHA CHRISTIE, CHEGOU A PENSAR RECUSAR ESTE DESAFIO?
É um erro alguém pensar que consegue substituir AgathaChristie. Não tenciono ser a nova Agatha, ou escrever exatamente como ela. A minha ideia foi elaborar um bom enigma, que Poirot pudesse solucionar, criar um puzzle (quebra-cabeças) que estivesse ao nível das suas célulazinhas cinzentas. Atirei-me de cabeça ao desafio de escrever um novo romance. Para mim foi uma honra, e adoro missões difíceis.

QUAL FOI O SEU MODELO PARA "OS CRIMES DO MONOGRAMA"?
As histórias de Agatha Christie são imprevisíveis, com grande mudanças na narrativa, num enredo bem estruturado. Esforcei-me por seguir estes princípios.

TORNOU-SE UMA AUTORA DE BESTSELLERS GRAÇAS À FICÇÃO DENTRO DO GÊNERO POLICIAL. AGATHA CHRISTIE DEVE TER TIDO PESO NA ESCOLHA DESTE CAMINHO. HOUVE OUTROS MOTIVOS?
Sim, é verdade que adoro policiais desde que descobri os livros de Agatha Christie. Nas histórias de crime há uma dimensão muito satisfatória no enredo: há sempre um mistério, o que leva o leitor a querer ir sempre avançando, além de ter a garantia (quando a história é bem escrita) de que esse mistério será resolvido no final. Além disso, no nosso cotidiano acho que temos um fascínio natural por encontrar respostas para as perguntas a que julgamos não conseguir responder. É por isso que o policial é o maior gênero literário.

UM GÊNERO QUE GOZA DE IMENSO SUCESSO. PORQUE NOS SENTIMOS TÃO PRÓXIMOS DE HISTÓRIAS COMO ESTAS?
É um gênero que encerra em si sempre uma motivação para deslindar um mistério, e portanto é o que está mais próximo da nossa forma de pensar na vida real. O desespero de descobrir quem matou “X” é o mesmo de "será que vou conseguir aquela proposta de trabalho, casa ou casamento?".

QUAL FOI A REAÇÃO DA FAMÍLIA DE CHRISTIE AO SEU ROMANCE?
Ficaram encantados com "Os Crimes do Monograma". É incrível ter conseguido escrever um romance que consideraram suficientemente bom para estar associado ao nome de Agatha Christie.

DEPOIS DE "OS CRIMES DO MONOGRAMA", JÁ HÁ PLANOS PARA NOVOS LIVROS?
Esperem para ver! Ainda não há planos, mas ninguém sabe o que pode acontecer no futuro.

ESPECULA-SE TAMBÉM SOBRE A HIPÓTESE DE ADAPTAÇÃO DO LIVRO ÀS TELAS, PARA MAIS UM REGRESSO DE DAVID SUCHET. É UMA POSSIBILIDADE REAL?
Não sei se chegará às telas, mas penso que não seria David Suchet a desempenhar o papel de Poirot. Ele deu por terminada essa participação e seguiu em frente. Portanto, se por acaso este livro chegasse à televisão, teríamos de escolher outra pessoa para fazer o papel deste belga brilhante.


Mais uma vez espero que tenham gostado!
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Abraço Forte e até a próxima...

sexta-feira, 19 de junho de 2015

Algumas Curiosidades sobre Marple & Poirot... A melhor dupla de detetives a trabalhar por conta própria!

Mediante às características dos mais famosos personagens da nossa Rainha do Crime, abordamos abaixo algumas curiosidades sobre eles. Boa Leitura!
 

TODOS TÊM NOME, ATÉ MISS MARPLE
É bonito dizer “Miss Marple”. É curto, ninguém esquece e está longe de ser um trava-línguas, mesmo para quem não conheça nada de inglês. Ao mesmo tempo, é perfeito para a personagem: na essência, esta detetive amadora é uma avó sem netos e com espírito de criança, uma mulher que se habituou a ver o que os outros não vêem e a fazer histórias com isso. O fato de conseguir descobrir assassinos no meio de cenários de crimes confusos não é escolha sua: Marple não consegue evitar.
Acrescente-se uma nota: se a tratássemos sempre pelo primeiro nome, Jane, certamente o resultado não seria o mesmo, não é?

ARMA SECRETA: INTELIGÊNCIA
Não há, no método de Jane Marple, nenhuma habilidade especial. Aliás, a verdade é que não existe método nenhum. O que Miss Marple tem – o que Agatha Christie lhe deu – é uma inteligência fora do vulgar. Dêem-lhe uma ponta de um véu que ela conseguirá revelar a peça inteira. Até porque uma das expressões mais óbvias desta clarividência acima da média está nos pequenos grandes nadas. Miss Marple, com toda a simpatia do mundo, faz a conversa e mantém o diálogo a correr. Os pormenores cotidianos que surgem nesses momentos bastam-lhe para descobrir o que parecia secreto.

PRIMEIRO OS CONTOS, DEPOIS O RESTO
Para Miss Marple, começou tudo nas revistas “The Royal Magazine” e “The Story-Teller Magazine”, a partir de 1927. Uma série de histórias que acabaram mal para uns quantos, que deviam ter prestado atenção aos detalhes; e que trouxeram a maior das sortes à investigadora sem carteira profissional: protagonizar um primeiro romance, “The Murder at the Vicarage”, de 1930, sobre um aldeão odiado por todos que aparece morto na igreja.

ACOMPANHADA SÓ QUANDO É PRECISO
Agatha Christie foi casada duas vezes e teve uma filha, Rosalind Hicks. Mas ao criar Miss Marple, fez as coisas de maneira diferente. Não lhe deu nenhum marido nem filhos. Aliás, família quase nem vê-la, a não ser o sobrinho, Raymond West, um escritor que, às primeiras aparições, ainda está a fazer o seu caminho e que, nas últimas, já aparece com algum reconhecimento. Há um tio, alguns primos, mas nada de muito próximo para a distrair do que mais lhe ocupava o tempo. Nunca trabalhou, mas não tem problemas financeiros e educação não lhe falta, das artes à anatomia.

SOLUÇÃO DE CRIMES NA TELEVISÃO
Houve dois grandes momentos de Miss Marple na televisão. O primeiro aconteceu entre 1984 e 1992. Joan Hickson protagonizou a produção da BBC e chegou a ser voz de alguns audiolivros com a mesma personagem. Em 2004, Marple regressou à televisão com o título “Agatha Christie’s Marple”. O papel principal foi atribuído a Geraldine McEwan, mas a atriz morreu em 2011, com 82 anos. A substituição surgiu com Julia McKenzie, a partir da quarta temporada. A série, da ITV, foi até à temporada seis (de 2013), para depois os direitos das adaptações de Agatha Christie serem comprados pela BBC.

AMIGAS PARA SEMPRE
Conta a história que AgathaChristie se inspirou, em parte, na vida da própria avó – e respetivas companhias – para criar a personalidade de Miss Marple. A autora afirmou em diferentes ocasiões que ambas tinham em comum o fato de esperarem quase sempre o pior das pessoas. Daí até chegarem a juízos de valor era preciso pouco. E tal como Jane Marple, também a avó Christie tinha a mania de acertar nas conclusões. Talvez daqui tenha surgido a preferência da “Rainha do Crime” por Miss Marple, sobretudo face a Poirot – ainda que tenha escrito mais histórias para o belga.

HERCULE DO PAI, POIROT MAIS OU MENOS
Agatha Christie tinha muita imaginação. E outra coisa que tinha era a mania das leituras. Era inevitável que, volta e meia, as duas se juntassem para criar uma outra coisa, diferente das originais. E por que esta matemática? Porque a escritora batizou este detetive belga partindo de dois outros personagens de ficção: Hercule Popeau, de Marie Belloc Lowndes, e Monsieur Poiret, de Frank Howel Evans. Juntando os dois, dá aquilo que já se sabe: Hercule Poirot, provavelmente o melhor nome de uma personagem para treinar o sotaque francês. Estão lá as curvas todas das vogais.

TODAS AS HISTÓRIAS MENOS UMA
Tal como não houve nenhum outro detetive privado como Poirot (e provavelmente vai tudo continuar assim), também não houve outro Hercule como David Suchet. Aliás, um sem o outro é coisa que não existe. O próprio disse, após o último episódio da série televisiva, que aquela era “a morte de um querido amigo”. Ligações sentimentais à parte, até os números ajudam a explicar isto: Suchet foi Poirot em todas as histórias escritas por Agatha Christie. Todas menos um pequeno conto. É esperar para ver o que acontece no futuro.

RESUMINDO POIROT
Tal como fez com Marple, AgathaChristie mostrou Poirot ao mundo com alguma idade logo a partir da primeira história. Se é para criar personagens que investigam crimes e encontram culpados, então que sejam criadas com alguma experiência. Família não é coisa que aqui importe muito. Hercule nasceu numa aldeia belga e teve como pais Jules-Louis e Godelieve Poirot, gente endinheirada e católica. Antes de ser detetive privado, foi policial. Já na reforma, dedicou-se ao trabalho no campo: nada de muito esforçado, sempre à procura do próximo meliante.

DO “ERA UMA VEZ” AO PONTO FINAL
Além de ser profissional encartado nas artes de descobrir malvados homicidas, Poirot é também mais antigo que Miss Marple nessas mesmas lidas. Tudo começou em 1920, com “The Mysterious Affair at Styles”. Poirot é um recém-chegado à Grã-Bretanha, depois de fugir da guerra no continente. Instala-se em casa de Emily Inglethorp, que o ajuda em tudo o que precisa. Pouco depois, Emily é encontrada morta. Vai daí, Hercule faz o que tem a fazer. Porque neste campeonato tudo tem de fazer sentido, a mesma casa acolhe a última das histórias com Poirot, “Cai o Pano”.

2+2=4, É FAZER AS CONTAS
Para Poirot, tudo tinha de estar bem engomado, o bigode no estilo, o chapéu onde tinha de ser. Na hora da investigação, a mesma coisa. Fugiu da guerra e instalou-se no campo inglês, mas nenhuma dessas transformações abalou as suas prioridades: ordem e método. E ambas as palavras deveriam sempre trabalhar em conjunto com as pistas, fundamentais para chegar a um final bem sucedido (muitas vezes, até escondendo algumas do seu ajudante Hastings).

UM MAL NECESSÁRIO
Poirot apareceu cedo na vida de Agatha Christie e foi essa a razão para que o caro Hercule tivesse sido o protagonista de quase o dobro das histórias de Jane Marple. Também por isso, foi público o cansaço da autora face ao detetive de bigodes. A própria chegou a descrevê-lo como “egocêntrico”. Ainda assim, continuou a dar-lhe histórias até 1975. Se o público gostava de ler Poirot, então que se fizesse segundo a vontade dos leitores – um sucesso que levou mesmo o “New York Times” a escrever o obituário do investigador. Agatha Christie morreria um ano depois, aos 85 anos.



Espero que tenho gostado!
Peço gentilmente que comentem, publiquem e compartilhem.

Abraço Forte e até a próxima!

Hora de Voltar

Caros leitores "Agathachristianos",

Depois de um longo período ausente, é com grande prazer e alegria que informo a retomada das publicações no rainhadocrime.blogspot.com.br.
Durante este período acompanhei diversas matérias publicadas referente à nossa Rainha do Crime, Agatha Christie, que certamente contribuirão em muito para nossa retomada.

Conto com a colaboração e participação de todos!
Sejam bem vindos novamente!

Abraço Forte
Thiago Medeiros

sábado, 22 de fevereiro de 2014

Agatha Christie por Zeca Camargo



Zaca Camargo - Apresentador
Surpresa é, quando se fala de Agatha Christie, um elemento fundamental. Quando você avança para seu terceiro ou quarto livro – nunca conheci alguém que tenha lido apenas um -, já está praticamente acostumado com a ideia de que vai ser surpreendido pela engenhosidade do criminoso revelado nas páginas finais. Motivos, álibis, armas – isso toda história policial tem. Mas as de Agatha Christie ainda tem algo mais: esse elemento surpresa que, quando finalmente é apresentado, você tem vontade de largar o livro e dizer: “não é possível!”.

Foi assim desde o primeiro que eu li. Me lembro de estar na sexta série quando a professora me pegou lendo o livro na aula, bem como a lembrança do susto e da bronca que eu levei neste dia, eu tinha 11 anos. O livro era “O misterioso caso de Styles”


A bronca da professora não é, porém, a única lembrança. Me lembro também do prazer de desvendar (por tabela) aquele crime, da impecável atmosfera inglesa que todos os capítulos evocavam (mesmo quando o protagonista era um certo detetivezinho inegavelmente belga!), da minha incapacidade de parar de ler – e sobretudo do frisson de pensar que eu estava lendo um “livro de adulto”… Sim, porque Agatha Christie, entre tantos méritos, ainda é a responsável por iniciar milhões de crianças e pré-adolescentes no mundo que, se não é exatamente o da literatura, pelo menos é um que certamente não se encaixa muito bem na definição de “livro infanto-juvenil”.

Com raras exceções, todos os personagens criados pela autora são adultos, circulam no mundo dos adultos, falam como adultos – e, claro, cometem crimes de adultos. Ao mesmo tempo, o magnetismo de sua narrativa não é dirigido exclusivamente aos adultos. Basta gostar de acompanhar uma história bem contada – e pronto! Quando você vê, já está no capítulo 17…

Livro - Capa
“Styles”, mesmo com toda essa carga de lembranças que evoca, não é meu livro favorito da autora. A surpresa no seu final é boa, mas aos poucos fui conhecendo outras ainda mais geniais que ela tinha elaborado. Vinha de qualquer aspecto da história: o motivo do crime (um noivado rompido na adolescência); o álibi do assassino (pensou em “O caso dos dez negrinhos”?); a banalidade de algumas mortes (“Tragédia em três atos”, talvez?); as maneiras de despistar a investigação (“Morte na praia” é exemplar nisso); a escolha do cenário para um homicídio (“Assassinato no campo de golfe”, “Um corpo na biblioteca” – entre tantos); na simples expectativa de um crime (“Convite para um homicídio”, lembra?); a maneira de encaixar a narrativa numa referência já conhecida (“Os doze trabalhos de Hércules” ou “Os cinco porquinhos”); ou mesmo o conjunto da obra (nem preciso comentar a monumentalidade de “Assassinato no expresso do oriente”, preciso?).

Já tendo passado por todos os títulos acima, eu já era um leitor acostumado a esse tratamento – a tramas que não apenas estimulam seu poder de dedução, mas também respeitam sua inteligência. Quando então me deparei com esse meu título favorito... Então lá vai: o melhor livro da autora, na minha opinião, é “O assassinato de Roger Ackroyd”.


Quem já o leu, sabe que agora estou diante de um problema: não posso comentar nada do livro, senão vai estragar essa que é das maiores surpresas que a autora já preparou. Não se trata de um simples “spoiler”, tipo: Hercule Poirot se associa ao doutor Sheepard para desvendar um mistério. Dizer porque eu gosto tanto de “Roger Ackroyd” seria não um mero estraga-prazeres, mas um insulto à própria memória de AgathaChristie. É um dos seus primeiros livros – é de 1926, enquanto que seu romance de estreia, que foi também minha iniciação no mundo “agathachristiniano”, “O misterioso caso de Styles”, é de 1920. Mesmo assim, acho que nada que ela escreveu depois – apesar de a lista conter alguns clássicos da autora – é tão eficiente no quesito surpresa.




Porém, ninguém lê Agatha Christie simplesmente em função da surpresa. Seu talento em nos cativar vai além disso, ou você acha que Gilberto Braga empresta de quem quando, ao escrever as cenas da morte da Taís, em “Paraíso tropical”, coloca um motivo para assassiná-la na boca de cada personagem principal da novela?

Mesmo em seus romances policiais mais fracos (e por mais fraco quero dizer aqueles que têm soluções fáceis demais, ou que não se aprofunda demais nos personagens – porque, oficialmente, para um fã como eu não existe nada realmente fraco que ela tenha escrito), a isca é colocada logo de início, e é quase impossível que um leitor abandone a história depois de tê-la mordido. A fórmula não foi inventada por ela – mas ninguém a aproximou tanto da perfeição como Agatha Christie. Ao reler um de seus trabalhos, tive a prova final disso.

Escolhi “É fácil matar” quase que por acaso. Entrei numa boa livraria, no Rio, e fui ver o que eles tinham da autora na prateleira. Muito pouco, para a minha decepção – “Roger Ackroyd”, por exemplo, está em falta. Com a escolha reduzida, fiquei entre dois dos títulos cuja história eu me lembrava muito pouco: “Por que não perguntaram a Evans?” e “É fácil matar”. Mesmo lendo a sinopse na contracapa da cada dos dois, tinha a impressão de nunca tê-los lido – o que era impossível, já que passei por 66 títulos da coleção na minha adolescência (meu pai às vezes se esquecia e me trazia um repetido, da elegante edição dos anos 70 da Nova Fronteira, que eu discretamente ia trocar no dia seguinte na livraria Mestre Jou, na rua Augusta… só uma pequena reminiscência, se me permite). De “Evans”, porém, eu me lembrava da cena do assassinato (que dá o nome à obra), e assim fiquei com o outro título.

A frase, tão simples e tão boa, é de uma certa Miss Fullerton – que morre logo depois de dizê-la a um ex-policial aposentado durante uma viagem de trem a Londres. Sem o brilho de Poirot nem a intuição fantástica de Miss Marple, “É fácil matar” é construído sobre um motivo mais que sórdido para uma série de crimes – que, como sempre, só é revelado no final. Durante toda a leitura, não havia jeito de eu me lembrar o que estava por trás daquelas mortes aparentemente acidentais – e, talvez por isso, foi tão bom ter escolhido este livro para reler e me preparar para este texto.

Apesar de ser um romance menor da autora, “É fácil matar” me fez passar por todos aqueles estágios que se experimenta com um livro de Agatha Christie: apresentação do crime, descrição dos suspeitos, construção dos possíveis motivos, checada nos álibis, culpado mais provável… tudo no caminho para que você chegue à conclusão antes de quem está investigando tudo no livro. Só que a conclusão que você chega é, invariavelmente errada. No caso desse livro, descobri o que motivava os crimes com certa antecedência – mas chutei feio quanto ao culpado, e errei. Só não fiquei decepcionado porque esse é o jogo mais delicioso de se entregar: brincar de quem é mais esperto com ninguém menos do que aquela que o livro “Guinness” dos recordes diz que é a autora que mais vendeu livros em todos os tempos.

Entusiasmado com esse recomeço, peguei, também ao acaso numa prateleira esquecida na minha casa, “Nêmesis”. Também me lembrava pouco desse ótimo enredo (um conhecido de Miss Marple, propõe, depois da sua morte, que a “velhinha bisbilhoteira” desfaça uma injustiça do passado), comecei a relê-lo displicentemente e, pronto! Estou novamente “viciado” em Agatha Christie… Isso quando a pilha de livros de outros autores que eu tenho vontade de ler só aumenta…


Autores “da moda”, clássicos brasileiros, literatura contemporânea, outras histórias tristes que eu gosto tanto – tudo isso pode esperar, pois agora eu tenho uns crimes para resolver…

sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

O Velho e o Novo Poirot... será que vai dar certo?

Por muitas vezes você pode ter se perguntado:
Como nasceu Poirot?

Bebê Poirot
Nos primeiros anos da década de 1910, uma jovem enfermeira inglesa encontrou um ônibus com refugiados belgas. Uma figura em especial chamou sua atenção: um homenzinho com a cabeça em formato de ovo e um bigodinho. Ficou fascinada por ele sem saber que, um dia, o mesmo aconteceria com gerações de leitores. A moça chamava-se Agatha Christie (1890-1976), e naquele dia ela encontrava a inspiração para criar um de seus mais famosos detetives, Hercule Poirot.

Em parte por conta de um desafio lançado pela irmã, Agatha começou a escrever O Misterioso Caso de Styles, romance de estreia de ambos. Outros detetives surgiriam – Miss Marple, Tommy e Tuppence – mas nenhum seria tão fortemente associado à Dama do Crime. Ex-policial, o detetive particular belga tem como características o peculiar bigode e o uso consistente das “pequenas células cinzentas”. É um homem baixinho, o que compensa com um grande ego. Sua aparência quase excêntrica é reforçada a todo momento, assim como o incômodo que sente ao ser confundido com um francês.
A relação dos dois se estendeu por 33 romances, uma peça e mais de 50 contos. Em língua inglesa, Agatha só perde em número de vendas para Shakespeare e, nos próximos meses, a L&PM relançará 30 de seus títulos, incluindo um que ela escreveu sob o pseudônimo Mary Westmacott.

A morte de Poirot (planejada pela autora desde os anos 1940), só aconteceria em 1975, em Cai o Pano. Tão grande foi a comoção, que o personagem ficcional ganhou um obituário no New York Times.

Quase 40 anos depois, Poirot protagonizará um novo romance, desta vez escrito pela também britânica Sophie Hannah. A poeta é autora de seis novelas policiais psicológicas publicadas em 27 países (três das quais sairão no País pela Rocco). Nesta semana, a autora entregou sua novela, prevista para setembro lá fora, e deu detalhes sobre como tomou para si o universo da Rainhado Crime – um projeto que tem apoio da família de Agatha.

“Nos meus livros, como nos de Christie, a trama é um componente importante, e as perguntas, os interrogatórios, estão ali, mas não pretendo introduzir uma maior profundidade psicológica aos protagonistas”, afirmou a escritora à agência de notícias EFE. Aos 13 anos, foi um livro da Dama que a inspirou a dedicar-se ao gênero.

Hannah diz que fez o possível para manter intacta a essência das obras, e que o novo livro se passará em 1929, escolha que se justifica porque, entre 1928 e 1932, Agatha não criou nenhuma história para o belga.

É preciso cautela para julgar uma obra que nem sequer foi lançada, mas uma decisão pode ser especialmente polêmica: neste livro, não encontraremos o capitão Hastings, melhor amigo e contraponto ficcional à personalidade de Poirot. No lugar, estará um novato da Scotland Yard. A escritora garante que ele conhece bem o detetive particular, o que lhe permitiu “dar um enfoque orgânico”. É verdade que o assistente não está em todas as histórias de Agatha (aparece especialmente nos contos e em menos de uma dezena de romances), mas adaptações dos textos o tornaram famoso. Numa comparação simplista, seria como ter Sherlock sem o dr. Watson.

Mesmo sem revelar detalhes da trama, Hannah disse que criou um caso diferente daqueles que Poirot está habituado a resolver. Assim, espera mostrar novos aspectos de sua personalidade “compatíveis com os escritos por Agatha”. Ela admite que tomar para si um personagem tão bem definido tem seu peso, mas diz que a pressão não é diferente da que sente quando escreve suas próprias obras.

 

Um mistério a ser desvendado é se a autora continuará escrevendo para Poirot no futuro. “Não depende de mim o número de romances que farei, e não sei se a família e os leitores vão querer que eu continue.”




Fonte: www.estadao.com.br/noticias/arte-e-lazer,sophie-hannah-da-detalhes-sobre-recriacao-de-obra-de-agatha-christie,1127929,0.htm 

terça-feira, 28 de janeiro de 2014

Poirot e Eu por David Suchet

Poirot and Me
Poirot and Me - Capa
Há mais de 24 anos interpretando o detetive belga Hercule Poirot, David Suchet decidiu compartilhar com os fãs suas experiências e lembranças sobre a produção da série Poirot.

No dia 7 de novembro ficou disponível  para donwload o ebook  “Poirot and Me”, publicado pela Headline e oferecido pelo Amazon. O livro traz curiosidades sobre a produção e atores convidados, entre elas, a forma como Suchet foi selecionado para interpretar o personagem, com o apoio da filha de Agatha Christie. Determinado a oferecer a interpretação mais autêntica de Poirot até o momento, ele enfrentou alguns obstáculos ao discutir com diretores e produtores a forma como o personagem deveria ser construído.

Segundo Suchet, em 1988, durante as filmagens do episódio “The Adventure of the Clapham Cook, da primeira temporada da série, o diretor Ed Bennett criticou a forma melindrosa como Suchet retratou a mania de Poirot por higiene. Na cena, ele tirou seu lenço do bolso e limpou o banco antes de sentar-se. Bennett considerou a ação ridícula. Defendendo seu ponto de vista sobre o comportamento do personagem, Suchet bateu o pé e se negou a mudar a cena. A discussão chegou ao ponto da equipe chamar o produtor Brian Eastman para que ele apartasse a briga.

Criada na década de 1980 com o objetivo de adaptar toda a obra de Christie estrelada pelo detetive, a série encerrou sua trajetória no último dia 13 de novembro, quando foi ao ar na Inglaterra o telefilme  “Curtain: Poirot’s Last Case. Antes disso, no dia 6 de novembro, o canal ITV apresentou o telefilme “The Labors of Hercules. No Brasil, a série é exibida pelo Film&Arts.


Suchet ainda sonha em voltar a interpretar Poirot. Ele espera que, no futuro, sejam produzidos remakes cinematográfico de algumas das histórias retratadas na série. A favorita dele é “The ABC Murders, exibida na TV em 1992.


Com o final da série, a editora HarperCollins anunciou a publicação de uma nova aventura de Poirot, escrita por Sophie Hannah, a ser publicada em setembro de 2014, com o apoio dos herdeiros de Christie. Embora a autora pretenda seguir o estilo narrativo da escritora, Suchet não tem interesse de estrelar qualquer adaptação que não seja um original de Christie.

Fonte: http://veja.abril.com.br/blog/temporadas/tag/poirot/

sábado, 2 de novembro de 2013

O Medo de Agatha Christie

Em sua autobiografia (que é um dos seus melhores livros, se não o melhor de todos) Agatha Christie discute de vez em quando alguns temas ligados à literatura policial, entre eles o do medo. Embora seja mais famosa por seus romances detetivescos, como os de Hercule Poirot e Miss Marple, ela escreveu também romances e obras de suspense,  dos quais o mais famoso, sem dúvida alguma, é “O Caso dos Dez Negrinhos”.

O que há de mais interessante na saudosa Rainha do Crime é que era uma mulher inteligente, intuitiva, perspicaz, mas sem muita sofisticação conceitual. Vendo-a discutir literatura, história da Inglaterra ou a vida de uma dona-de-casa, estamos diante de alguém que pensa com sutileza e originalidade, mas em momento algum transforma isto em linguajar "pseudofilosofante".

Ela relata que, na infância, uma das coisas que mais lhe causavam medo era a brincadeira da “irmã mais velha”, uma irmã fictícia, que ela imaginava ser louca e moradora de uma gruta, além de ser sósia de sua irmã mais velha, Madge.

A brincadeira consistia em Madge mudar de voz no meio de uma conversa qualquer, e dizer:

_Agatha, você sabe quem eu sou, não é?  Sou Madge. Você não está pensando que eu sou outra pessoa, não é?

A mudança na voz... a mudança no olhar... alguns pequenos gestos... e isto bastava para que Agatha, com cinco anos, tivesse certeza de que não era Madge que estava ali, mas “A Irmã Mais Velha”... Consequentemente a futura e destemida Rainha do Crime, saía correndo, aos gritos.
Depois, comentava ela:

_Por que gostava tanto da sensação do medo? ... Será que habita em nós algo que se rebela contra uma vida com excessiva segurança? ... Será que é necessária à vida humana a sensação de perigo? ... Necessitamos instintivamente de algo a combater, a superar, como se fosse uma prova que quiséssemos dar a nós próprios? ... Se tirássemos o lobo da história de Chapeuzinho Vermelho, alguma criança gostaria dessa história? ...

O medo pode vir dessa capacidade de estranhamento, de distanciamento, de olhar algo que nos é familiar e ver naquilo uma presença ameaçadora. Este processo mental é o reverso de outro que busca nos apaziguar, transformar o estranho ou ameaçador no familiar, no que está sob o controle da consciência.


Agatha relata também a história divertida de um de seus netos, Matthew, que certa vez ela viu, aos dois anos de idade, descendo uma escada sozinho. Com medo de rolar pelos degraus, ele se agarrava à balaustrada, descia um degrau de cada vez, murmurando baixinho:

_Este é Matthew... ele está descendo a escada...

É uma ilustração nota-dez do nosso processo de racionalização, de “olhar de fora” algo arriscado para assumir um mínimo de controle sobre o que ocorre. E ela diz que todas as vezes que precisava participar de eventos públicos, apesar de sua timidez, murmurava para si mesma:

_Esta é Agatha... ela é uma escritora famosa... vai dar uma palestra...

E isto a tranquilizava...


"Um dos nossos maiores medos é o medo daquilo que nossa mente não consegue dominar"